Ford Capri: Anglo Saxão de Sucesso nas ruas e pistas
Em 1965 a fábrica inglesa da Ford, situada em Halewood, perto de Liverpool, desenvolvia uma idéia nascida a partir do estrondoso sucesso de um Ford norte-americano, o Mustang. Os responsáveis pelo “Projeto Colt” buscavam um cupê pequeno e atraente, que pudesse receber várias motorizações e opcionais. Seria fabricado na Inglaterra e na Alemanha.
Modelos em escala natural (mock-ups) foram apresentados em clínicas em Londres (Inglaterra) , Colônia (Alemanha) , Milão (Itália) e outras cidades no início de 1966. Em julho a Ford decidia por sua produção, que começava em novembro de 1968 para que todas as concessionárias pudessem receber no mínimo uma unidade até o lançamento oficial, em 5 de fevereiro de 1969. A apresentação mundial deu-se no Salão de Bruxelas, na Bélgica, em 24 de janeiro daquele ano.
O carro foi rebatizado Capri, nome já empregado em uma versão do Ford Cônsul de pouco sucesso, pois a designação Colt já estava registrada pela Mitsubishi. O modelo, com nome de uma charmosa ilha italiana do litoral do Mar Tirreno, nascia para fazer parte de uma linha de veículos bem completa. Tinha como irmãos a primeira geração do Escort, o Cortina na Inglaterra, o Taunus (saiba mais) na Alemanha, o Cônsul e o Granada.
Com linhas simples e bonitas, era difícil não agradar. Media 4,30 metros de comprimento e adotava formato fastback, frente longa e duas portas. Logo atrás destas, na parte inferior, duas entradas de ar falsas lhe davam certa esportividade. Os vidros laterais traseiros, quase um semicírculo, foram adotados depois que estudos iniciais apontaram uma sensação de claustrofobia dos passageiros do banco posterior. Era uma carroceria meio esportiva, meio familiar para quatro passageiros. Na versão mais simples tinha faróis retangulares e grade com frisos horizontais.
Sua motorização básica, na Inglaterra, era o 1,3-litro do primeiro Escort, motor denominado Kent, que originaria mais tarde o Endura-E utilizado aqui no Ka e no Fiesta ,com 61 cavalos, quatro marchas e tração traseira. Mal passava dos 140 km/h e de 0 a 100 km/h exigia 20 segundos, mas esta configuração era a mais modesta e barata de todas. Na Alemanha, o modelo similar recebia outro 1,3 com a rara configuração V4 (quatro cilindros em V) e 50 cavalos.
Logo depois vinha o motor 1,6, emprestado do Ford Cortina, que também cedia as caixas de câmbio para o cupê. A partir desta cilindrada podia receber transmissão automática como opcional. O 1600 GT oferecia potência de 82 cavalos e dupla carburação. Chegava a 170 km/h, fazendo de 0 a 100 km/h em 14,5 segundos. Com este motor, para a época, já era interessante, o primeiro degrau para a esportividade. O Capri tinha as versões de acabamento básica, L, XL, XLR e GT.
As versões GT recebiam conta-giros, volante esportivo e painel e console com acabamento imitando madeira. Podia vir com a pintura em dois tons ou com capô preto-fosco, teto solar… O leque de opcionais para os Capri, a exemplo do Mustang, era enorme.
Um pouco acima vinha a versão 2000 GT Special, com quatro cilindros em V, 2,0 litros e 93 cavalos, motor utilizado também pelo Ford Corsair. Por fora era notável o pequeno aerofólio sobre a tampa do porta-malas e as persianas sobre o vidro traseiro, copiando certo esportivo famoso italiano. Tinha teto de vinil, capô preto-fosco e rodas esportivas com desenho bem parecido às do primeiro Corcel GT.
Fazia 175 km/h de velocidade máxima e de 0 a 100 km/h em 11 s, números muito bons para um compacto esportivo de 1970. Este modelo foi preparado pela AVO (Advanced Vehicles Operations), departamento da Ford para carros especiais na Inglaterra.
A versão de topo, 3000 GT, recebia o motor denominado Essex como o do 2000 GT, mas era um seis cilindros em V com 128 cavalos. Esta máquina, herdada do antigo Zodiac, mantinha o comando de válvulas no bloco e conseguia a melhor aceleração de todos os Capri: 0 a 100 km/h em 10 s. Seus pneus eram 185/70 HR 13 para suportar a velocidade máxima de 185 km/h — já trazia adrenalina. Em 1971 a potência subia para 138 cavalos, o que fez a velocidade final beirar 200 km/h.
Na Alemanha as opções de motores eram similares. A mais atraente e vitaminada era a RS 2600, que não foi vendida na Inglaterra. Introduzida pela Ford Motorsport em 1971, trazia motor de seis cilindros em V, do Ford Granada, com potência de 150 cavalos e injeção indireta, além de potentes freios a disco na dianteira. Esta versão, com 3.532 unidades produzidas, serviu de base para as competições e brilhou nas pistas.
Na carroceria as diferenças eram mínimas, sendo que as versões mais esportivas adotavam quatro faróis redondos e, na grade, faróis auxiliares de longo alcance. Faixas decorativas na cor preta não faltavam nas laterais e o capô preto-fosco sempre estava presente. Em 1972 o RS 2600 recebia diferencial autobloqueante. Fabricado até 1974, é o mais cotado dos Capri produzidos, ficando seu valor hoje em torno de US$ 18.000 no mercado europeu.
Até o final de 1973 foram produzidos 1.172.000 exemplares do Capri. A marca de um milhão foi atingida pela fábrica de Colônia, na Alemanha, em agosto do mesmo ano com um RS 2600. Em fevereiro de 1974 surgia a segunda geração, fruto do projeto Diana (curiosamente, o novo Escort da época era o projeto Brenda) e batizada de Capri II. A nova carroceria, mais moderna e atraente, também estava mais longa, larga e alta. Os estilistas foram bem sucedidos na empreitada.
Mais aerodinâmica, o capô mostrava discreta inclinação para a frente, assim como toda a carroceria ficou com linhas mais curvas e suaves. Lembrava muito o desenho anterior e era fácil identificá-lo. Na frente, faróis retangulares nas versões básicas ou quatro redondos nas mais caras. Nos modelos esportivos, dois auxiliares abaixo do para-choque. O capô com o ressalto central continuava marca registrada da linha Capri, mas não tinha mais as duas falsas entradas de ar.
Como boa novidade, o carro passava a ser um hatchback, com uma terceira porta traseira (no detalhe, abaixo) que facilitava a entrada de grandes objetos. Por dentro o banco traseiro e também o do passageiro dianteiro podiam ser rebatidos. A motorização básica ainda era o 1,3-litro de 66 cavalos, mas o 1,6 de 91 cavalos era de concepção nova e recebia comando de válvulas no cabeçote. O desempenho melhorou muito: máxima de 173 km/h. O cliente podia optar por câmbio de quatro ou cinco marchas e ainda o automático.
As versões 2,3 de quatro cilindros e 3,0 de seis cilindros em V vinham com o acabamento mais refinado que levava a assinatura da famosa marca italiana de carrocerias Ghia, cuja cooperação com a Ford existe até hoje. O Capri II trazia suspensão mais suave e bitola traseira 6 cm mais larga. Em 1975, no Salão de Genebra, na Suíça, era apresentada a série especial Midnight. O carro era todo preto, com filetes dourados, baseando-se na versão GT com motor dois litros e muitos acessórios. Fez sucesso.
A terceira e última evolução, chamada pelos fãs de Capri série III (embora a Ford não se referisse assim ao projeto Carla), veio em março de 1978. Pouca coisa havia mudado na carroceria. Na frente era mais notável a grade mais baixa e o capô liso, sem o ressalto. Agora todos os modelos da linha tinham quatro faróis redondos. O coeficiente aerodinâmico evoluía de 0,428 do Capri II para 0,403 no novo carro.
O motor de menor potência passava a ser o de 1,6 litro, com potência variando entre 68, 73 ou 91 cavalos. Dependendo do mercado a que era destinado, o 1,3 continuava disponível. Os motores mais potentes eram o intermediário 2,3-litros de 114 cavalos e o forte e apreciado V6 de 2,8 litros, lançado em 1981, com injeção mecânica Bosch K-Jetronic e 160 cavalos a 5.700 rpm. Chegava a 210 km/h. O mais veloz Capri, contudo, aparecia em setembro de 1981.
O 2800 Turbo era o primeiro resultado da Special Vehicle Engineering (SVE), recentemente introduzida pela Ford em Dunton, Essex. Trazia, por fora, spoiler dianteiro e pequeno aerofólio traseiro incorporado à carroceria, além de bonitas rodas de liga leve de 7 x 13 pol. O interior exibia bancos esportivos Recaro, teto solar e sofisticado sistema de áudio.
A motor Cologne, já oferecido no mercado norte-americano com aspiração natural, tinha 188 cavalos de potência, injeção Bosch K-Jetronic, turbocompressor e radiador de óleo. Havia direção assistida, freios a disco ventilado e suspensão redimensionada. Fazia 215 km/h de velocidade final e 0 a 100 km/h em 8,5 s — uma fera que deixava muitos carros sofisticados e caros para trás. Sacudiu a concorrência. Mas as versões de menor preço eram as grandes responsáveis pela manutenção do Capri entre os dez carros mais vendidos do mercado inglês em 1980, onze anos após o lançamento do primeiro modelo.
O Capri deixou de ser fabricado em 1984. Seus concorrentes na Europa mais conhecidos e famosos foram o Opel Manta, o Fiat 124, o Lancia Beta, o Renault 17 e o VW Scirocco. Em substituição a ele e ao Taunus veio o Sierra, que nasceu do carro-conceito Probe. O novo médio, que existia nas versões sedã, cupê, 4×4 e perua, fez bonito também nos ralis e autódromos.
As versões mais potentes são as mais procuradas pelos colecionadores e, apesar de não terem ainda grande valor histórico, estão começando a despertar interesse. O conjunto do Capri foi sempre muito robusto. A tração traseira e os motores de cilindrada mais alta eram muito apreciados pelos entusiastas da direção esportiva. O carro era uma verdadeira escola de pilotagem, garantia de ótimas emoções.
Nas pistas
O departamento de competições da Ford Europa era muito ativo nos anos 70. O Escort (cuja primeira geração nasceu em 1968) já fazia sucesso nos ralis (ganhou o Rali da Copa) e eles estavam empenhados em aperfeiçoar o Capri para as pistas de asfalto. O objetivo era competir nos campeonatos de turismo daquele continente, que sempre foram ótima fonte de publicidade devido ao grande número de pessoas que iam aos autódromos.
Em 1972 o Capri chegou em 8º. e 10º. lugares na classificação geral da famosa 24 Horas de Le Mans. Na mais dura e competitiva prova de longa duração para carros de turismo, a 24 Horas de Spa-Francorchamps, ficou com os três primeiros lugares. Concorreu com BMW, Alfa Romeo, Chevrolet Camaro e outras feras.
Depois de dois anos vencendo o Campeonato Europeu de Turismo com o Capri RS 2600, a Ford o perdia em 1973 para o BMW 3.0 CSL, chamado de “batmóvel” por sua aerodinâmica sofisticada. A resposta veio no ano seguinte com o Capri RS 3100. Foram preparados quatro carros para a disputa, com motor da conceituada e competente Cosworth. Tratava-se de um V6 de 3,4 litros, quatro válvulas por cilindro e 420 cavalos, com o qual chegavam a 270 km/h.
Para melhorar a aerodinâmica, a Ford implementou spoilers dianteiro e traseiro (“rabo de pato”) mais pronunciados, que pelo regulamento da categoria teriam de ser aplicados a 100 unidades homologadas para uso em rua. O coeficiente aerodinâmico (Cx) caiu para ótimo 0,374. O piloto alemão Heyer ganhou o campeonato de pilotos. Também dirigiu este carro naquele ano um jovem e promissor piloto, chamado Niki Lauda.
Está em quase todas as competições europeias de Veículos Históricos de Competição (VHC) na categoria Heritage Touring Cup ou U2TC. Esta reúne carros do inicio do Campeonato Europeu de Turismo. Eram carros de pequena cilindrada se comparado aos protótipos que enfrentavam com galhardia os grandes. Foram os: Alfa Giulia Bertone, BMW 2002, 3.0 CSL, 530, Ford Escort, Capri, Cortina, Mini Morris e outros muito bons de pista!
Veja mais no Spa Classic, Hungaroring Classic, Age D’Or, Tour Auto e no Jarama Classic
Abaixo dois grandes pilotos muito conhecidos da época fazendo uma propaganda para o Capri
Em Escala
Vários fabricantes tiveram interesse em fazer miniaturas de metal deste modelo da Ford. Podemos citar o modelo da Matchbox, de cor laranja com capô preto-fosco, que se abria mostrando um motor detalhado. Os pneus eram largos e o carrinho fazia parte da série Superfast. Outro vermelho foi lançado após mostrando um motor V8 avantajado!
A Solido francesa caprichou na escala 1/43 com modelos de competição. Os para-lamas eram mais largos para receber pneus avantajados. Caprichou também na decoração, com decalques que copiavam os originais de competição. O 2600 RS fez parte do catálogo em 1978 e 1979. A Majorette, também francesa, fez o Capri II com teto na cor preta, imitando o vinil, e portas que se abriam, muito bem acabado. O dragster branco é um “Santapod Gloworm” na escala 1/43 da Corgi Toys.
Acessórios
Para o Capri estava disponível toda uma gama de acessórios, para uso em carros de competição ou de rua. Para-lamas, capô e tampa do porta malas em fibra de vidro para aliviar o peso, aerofólio, polainas para o vidro traseiro, barras anti-capotagem, volantes, bancos especiais. Para o motor havia comandos especiais, coletores de admissão, cornetas de aspiração, escapamentos, carburadores… Tudo para deixá-lo ainda mais feroz.
Texto fotos e montagem Francis Castaings. Fotos de divulgação e das organizações Peter Auto publicadas neste site
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