Gurgel linha X12- Os automóveis de Rio Claro

Gurgel linha X12- Os automóveis de Rio Claro

A Gurgel Veículos , nossa mais famosa fábrica de veículos fora de estrada e lazer produziu utilitários de sucesso durante duas décadas.

A cidade de Rio Claro, no interior do estado de São Paulo, já sediou uma importante indústria de automóveis nacionais. Foi fabricado lá durante duas décadas utilitários, carros elétricos e carros urbanos. Foi fundada em primeiro de setembro de 1969 pelo intrépido engenheiro mecânico e eletricista João Augusto Conrado do Amaral Gurgel que sempre sonhou com o carro genuinamente brasileiro. Devido às exportações que sua empresa passou a fazer com o sucesso de seus produtos, ele sempre dizia que sua fábrica não era uma multinacional, e sim muito nacional. O capital era 100 % brasileiro.

Este homem com ótimas ideias e dinâmico sempre inovou, sempre foi original. E quase tudo que aplicou, deu certo. Formou-se na Escola Politécnica de São Paulo em 1949 e, em 1953, no General Motors Institute na América do Norte. Começou fazendo mini carros para crianças, no caso uma réplica de um Karmann-Ghia e de um Corvette. Eram muito fiéis, bem acabadas e seguia a escala na medida do possível para comportar duas crianças. Eram movidos por motores mono cilíndricos. O primeiro, para os adultos, foi um bug com linhas muito modernas e interessantes sob a plataforma, motor e suspensão Volkswagen e se chamava Ipanema. Gurgel sempre batizou seus carros com nomes bem brasileiros e sempre homenageava nossa tribos de índios. Depois veio o Xavante que daria início ao sucesso da marca. Seria seu principal produto durante toda a sua evolução e existência da fábrica. Foi lançado em 1973.

Não era mais um bugue e sim um utilitário que gostava de estradas ruins independente da meteorologia. Seus quatro faróis redondos dianteiros eram protegidos por uma grade de metal preta. Sobre o capô dianteiro era notável a presença do pneu estepe. Sua distância do solo era alta. O para-brisas rebatia para melhor sentir o vento batendo e a capota era de lona preta sustentada por barras anti-capotagem.

Tinha linhas curvas seguindo uma tendência dos bugs da época. Os para-lamas tinham as caixas de roda com grande abertura, ideal para a prática do fora de estrada. Um par de pás afixadas nas portas para cavar e sair de situações mais extremas chamava a atenção. Este acessório inédito anunciava o propósito do veículo e o identificava logo. Ele foi incorporado a linha pela participação do X12 em desfiles militares.

Era equipado com a tradicional e robusta mecânica Volkswagen arrefecida a ar com posicionamento e tração traseiro. O acesso a este nunca foi dos mais amigáveis. Era feito por uma pequena tampa estreita e não muito comprida. O chassi era uma união de plástico e aço (plasteel) que aliava alta resistência a torção e de difícil deformação. A carroceria era em fibra de vidro. Conta-se que, na fábrica, existia um taco de beisebol para que os visitantes batessem forte com o mesmo sobre a carroceria para testar a resistência. Não amassava, mas logicamente este teste meio bruto e pouco comum era feito antes do carro receber a pintura.

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A carroceria e o chassi formavam um único monobloco. Seu peso total montado era de 840 quilos. Pelo emprego destes materiais a corrosão estava completamente banida. As rodas, que eram as mesmas do Volkswagen Kombi, eram equipadas com pneus de uso misto e como opcional poderia vir com calotas exclusivas. A suspensão era independente nas quatro rodas, usava amortecedores telescópicos e barras de torção em feixes. Atrás tinha semi eixos articulados, molas helicoidais, braços tensores longitudinais e cintas limitadoras. O conjunto era muito robusto. Para subir ou descer morros não tinha grandes dificuldades. Dificilmente nestas ocasiões ele raspava. A carroceria tinha ângulos de 63 graus na frente e 41 graus atrás respectivamente.

Além do Plasteel, como era chamado o sanduíche do chassi, outro requinte era o Selectraction. Tratava-se de um sistema movido por alavancas para bloquear uma das rodas traseiras. Estas ficavam ao lado do freio de mão. Era utilíssimo em atoleiros, pois bloqueando uma das rodas que estivesse girando em falso, a força era transmitida a outra, facilitando a saída do barro. Bastava puxar a alavanca devida. Girando o volante para um lado ou outro, a eficiência era maior. Também era bom para dar cavalo de pau e fazer outras peraltices. Com este sistema o carro ficava mais leve, portanto mais econômico do que se tivesse com tração nas quatro rodas. E a eficiência era quase tão boa quanto. O Xavante logo agradou ao público por sair da concepção tradicional dos bugues e ao exército brasileiro que fez grande encomenda. Tinha uma versão militar especialmente produzida para este. Isso deu um ótimo impulso na produção.

Na primeira reestilização do Xavante, em 1975, as linhas da carroceria ficaram mais retas. O estepe agora ficava sob o capô mas o ressalto neste anunciava sua presença. Sobre os para-lamas dianteiros ficavam as lanternas direcionais idênticas as do Fusca. As pás afixadas as portas passaram a ser opcionais. Como versões havia o X10, mais simples e o X12 que era a versão civil do utilitário das forças armadas. O motor traseiro com quatro cilindros opostos tinha 1.584 cm³ de um só carburador que fornecia 60 cavalos a 4.600 rpm. Usava a transmissão mais curta do motor que equipava o Fusca 1,3 litros. Tinha caixa de quatro marchas e tração traseira. Atrás das portas havia uma pequena grade plástica em forma de polígono para a ventilação do motor.

A velocidade final não chegava a empolgar quem queria um carro veloz. Fazia no máximo 120 km/h e seu 0 a 100 km/h eram em penosos 22 segundos. Mas seu objetivo era mostrar serviço e desempenho com conforto em caminhos difíceis, pouco amistosos a carros de rua velozes. Sua estabilidade era, e sempre foi, em ruas de asfalto ou paralelepípedo, um pouco crítica. Nas pistas, ruas e estradas era melhor não arriscar nas curvas. Ele gostava era de lama, terra, água, neve, praia, montanha e floresta que eram seu habitat natural. Media 3,4 metros de comprimento, 1,62 de largura, 1,58 de altura e entre-eixos de 2,4 metros. Fácil de estacionar, de dirigir e de domar. Por causa de todo o conjunto muito robusto, era um veículo barulhento para o dia a dia.

Em 1976 chegava o X12 TR, de teto rígido. Suas linhas estavam mais quadradas e retas e ainda transmitiam respeito Continuava um utilitário bastante rústico.

Os faróis redondos agora estavam embutidos na carroceria e protegidos por pequena grade. Na frente era destacável o guincho manual por sistema de catraca que permanecia como na versão anterior e poderia ser utilizado em situações fora de estrada que era seu ambiente natural. O cabo de aço deste tinha 25 metros de extensão. As portas tinham dobradiças e na traseira, sobre a pequena tampa do motor, outro acessório interessante. Baseado nos Utilitários da Segunda Grande Guerra, um tanque sobressalente de 20 litros. Ou como alguns gostavam de chamar, camburão. Era um dispositivo útil, muito interessante e bem vindo para as aventuras fora de estrada. Seguia a regulamentação do Detran. O tanque normal tinha capacidade para 36 litros. Na frente, o pequeno porta-malas abrigava o pneu estepe e o tanque de combustível. Para as malas, havia quase nenhum espaço, só se fosse lá dentro junto com os passageiros. Seu painel era muito simples e continha o extremamente necessário.

O chassi plasteel continuava como padrão e a fabrica oferecia uma garantia inédita de 100.000 quilômetros e foi patenteado pela Gurgel desde o início de sua aplicação. Um fato interessante é que todos os carros fabricados pela Gurgel tinham carrocerias originais. O engenheiro nunca copiou nada em termos de estilo, mesmo lá de fora, coisa corriqueira hoje em dia entre fabricantes de veículos fora de estrada, utilitários, 4 x 4 e afins. Seja grande ou pequeno construtor. Em 1979 toda a linha de produtos da fábrica foi exposta no do Salão do Automóvel em Genebra, na Suíça. Neste evento a propaganda do utilitário nacional e o volume de vendas foi muito bom.

Em 1980 a linha era composta de 10 modelos. Todos podiam ser fornecido com motores a gasolina ou álcool apesar do Engenheiro Gurgel combater muito este tipo de combustível. Este combustível brasileiro era subsidiado pelo governo o que tornava o preço final para o consumidor mais barato que a gasolina. Só que o engenheiro achava que seria mais lógico usar estas terras para plantar alimentos para a população do que para alimentar veículos. Faziam parte da linha de produtos da fábrica o X12 TR com teto rígido, mais o utilitário comum com capota de lona que era a versão mais barata do X12, o simpático Caribe, a versão bombeiro, o X12 RM (Teto rígido e meia capota) e a versão X12 M militar. Este, exclusivo para as forças armadas, já vinha na cor padrão do exército, com emblemas nas portas e acessórios específicos.

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Em 1982 o X12 normal seguia seu caminho na produção e nas estradas de serras, lamas e areias do Brasil. Estava com a mesma carroceria mais reta da versão de teto rígido(TR). Continuava com o para-brisas dobrável e a capota de lona presa com botões de pressão, como numa calça de brim. Os retrovisores externos e internos ficavam presos na estrutura do para-brisas. Tudo muito prático e simples.  A carroceria agora recebia uma faixa branca que contornava a porta e o para-lamas. E seu tanque passava ter 40 litros e o consumo era de 11 km/l.

Uma falsa grade preta de plástico ficava na frente do capô com o logotipo da fabrica posicionado no canto superior esquerdo. Caso o cliente optasse pelo guincho, esta dava lugar a ele. As portas eram de plástico reforçado. O pequeno e simpático utilitário recebia opcionalmente rodas esportivas brancas bonitas de 14 polegadas (pneu seis lonas 7,00 x 14) no lugar das originais de 15. Nesta caso, os pneus eram mais largos, mais esportivos. Em 1981 tinha aro de 15 polegadas e pneus cidade/campo nas medidas 7,35 x 15. Sua direção não tinha assistência, mas não era pesada.

Na versão Caribe a capota, e bancos eram listrados com cores vivas e alegres que combinavam com a carroceria no mesmo tom. Neste caso a roda branca era de série. Na versão básica não trazia pás mas o guincho e o camburão estavam lá. Seu ambiente natural eram as belas praias do mundo todo. Era um veículo para o lazer. O nome depois foi trocado para Tocantins. Tinha linhas mais modernas, mais atuais mas ainda lembrando bem suas origens.

Em 1983 a versão teto rígido do X12 recebe uma clarabóia no teto. Este artefato era bastante útil para refrigerar a cabine. Um defeito na versão TR que jamais foi sanado era que sua porta era presa ao para-lamas dianteiro por dobradiças. Qualquer um que chegasse armado com uma chave Phillips podia desmontar, entrar no utilitário para roubar objetos ou mesmo dar uma voltinha com ele.

No modelo 1985 as novidades eram a nova grade com seis colunas e três linhas formadas por pequenos retângulos, novos para-choques e lanternas traseiras na parte externa. Por dentro o painel e o volante também eram novos e mais modernos. Na versão luxo bancos com encosto alto mais confortáveis e a clarabóia. Na parte mecânica vinha como novidade a ignição eletrônica, nova suspensão traseira e diferencial com nova relação que o deixou mais veloz em rodovias, mais econômico e mais silencioso. O XT foi fabricado até o fechamento da fábrica em 1995 quando foi decretada a falência da empresa. Infelizmente!


Usos e Versões Especiais do X12

Empresas que trabalhavam com reflorestamento o utilizavam como veículo fora de estrada por ser uma opção mais barata que o Toyota e bem robusta. Serviu como táxi em cidades do litoral do Brasil como a de Mostarda, no Rio Grande do Sul. A versão tinha bagageiro no teto para carregar mais malas já que seu porta-malas era muito limitado. A corrosão não afetava sua estrutura.

Também foi usado em canteiros de obras pela Petrobrás, Nuclebrás, Emater, Furnas, etc… e pelo exército brasileiro. Sempre longe do asfalto e perto da terra.


Os concorrentes do X12 – No começo seus adversários para o trabalho pesado eram o Bandeirante da Toyota bem mais caro e o Jeep da Ford/Willys. Depois veio uma enxurrada de opositores como o Bugre FC-15, o Búfalo da BRM, o Javali da CBT, o Jeg da Dacunha Veículos que tinha o diferencial blocante seletivo e 4 x 4 ao mesmo tempo. O Engesa EE12 corria, ou melhor, pulava noutra categoria, mas também era uma opção fora de estrada.


Lá fora – Nas ilhas do Caribe, o X12 fazia sua presença entre os turistas. Era comum vê-lo em Saint Barthelémy, Bahamas, Jamaica e em outros lugares paradisíacos e chiques. Também foi exportado e homologado em vários países da Europa, África, nas três Américas e Oriente Médio. Ao todo mais de 40 países.


Texto, Fotos e montagem Francis Castaings.

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