Jensen Interceptor: Esportividade em traje de gala

Jensen Interceptor: Esportividade em traje de gala

Nas décadas de 60 e 70, os britânicos Jensen foram sinônimos de sofisticação e exclusividade 

Nos anos 20 os irmãos Jensen, estabelecidos em West Bromwich, na Inglaterra, construíam  carrocerias esportivas e as montavam em chassis de carros de produção em série. O primeiro deles  foi sobre um Austin Seven. Era um modelo de dois lugares, com pára-brisa levemente inclinado para  trás, capô longo e traseira curtíssima — um pequeno esportivo muito atraente.

No início dos anos 60 nascia o CV8, cupê elegante e muito rápido (esquerda) que antecedeu ao  Interceptor FF (no alto, um modelo       1966)

Em 1937 veio o primeiro Jensen, com mecânica Ford V8 de 3,6 litros, dois carburadores e caixa  manual com overdrive (saiba mais) Laycock de Normanville. O sistema destinava-se a produzir efeito sobremarcha e fazia o ruído e o consumo caírem, porque as rotações do motor eram mais  baixas. O overdrive, uma pequena caixa adicional de comando elétrico, era para ser usado sobretudo em estradas. 

Apesar de manter o apelo esportivo, tinha quatro lugares, sendo que os dois traseiros tinham uma cobertura de lona para protegê-los das intempéries quando não eram usados. A empresa sempre inovava e manteve esta tradição em detalhes de carrocerias e mecânicos pouco ortodoxos. Além da   grade vertical do radiador, tinha entradas de ar com grades cromadas nos para-lamas.

No pós-guerra, em 1949, a Jensen dava início à série Interceptor, que faria enorme sucesso durante   décadas. Um bonito sedã de quatro portas com capota de lona, motor Austin de quatro litros e seis     cilindros. As linhas eram bem curvas, seguindo a tendência da época; tinha dois faróis auxiliares. Mantinha a transmissão com overdrive e chegava aos 140 km/h de velocidade final — nesta   velocidade a rotação ficava abaixo de 3.400 rpm.

Em 1954 a esportividade continuava e era lançado o modelo 541 (acima)  O esportivo era muito bonito,    equipado com belas rodas raiadas com cubo rápido central, frente longa com para-lamas em curva     descendente e faróis redondos. A grade dianteira quase oblonga traduzia agressividade. Tinha motor Austin com três carburadores e era equipado com servofreio. Em 1956 passava a contar com freios a disco nas quatro rodas e caixa overdrive de série.  O interior sofisticado, com acabamento típico dos melhores carros ingleses, era um destaque do Jensen 

Uma versão mais potente, 541 R, chegaria em 1957. Alcançava a velocidade final de 200 km/h, o   que o colocava no páreo do Jaguar XK150, evolução do famoso XK120 e seu maior concorrente. 

No início da década de 60, a fábrica fez várias alterações no chassi do 541, colocou um potente   motor Chrysler V8 de 5,9 litros e transmissão automática Torqueflite. Nascia o CV8, carro esporte     muito bonito e moderno, que chegava aos 225 km/h. Em 1964 o CV8 recebia um motor ainda mais forte, de 6,3 litros, 335 cv a 4.600 rpm, válvulas no cabeçote e um carburador de corpo quádruplo da marca Carter. Um precursor: sua mecânica   trazia inovações como freios antitravamento e tração nas quatro rodas. Grandes marcas só adotariam  anos depois.

Em 1966 era lançado um novo Interceptor, que seria o maior sucesso da marca. Foi o Jensen que  teve a maior repercussão mundial. Tinha motor de origem norte-americana, um Chrysler “big block” (bloco grande), com oito cilindros em “V”, 6,3 litros, 330 cavalos brutos. Chegava a 228 km/h e acelerava   de 0 a 96 km/h (60 milhas por hora) em 6,7 segundos. Colocava-se na classe dos supercarros pelos ótimos números de desempenho — e era muito elegante.

Trazia tração nas quatro rodas permanente, inédita para um carro esporte. Foi o verdadeiro  precursor dos atuais automóveis 4×4, muito antes que Audi e Subaru popularizassem o sistema. A  tração era fabricada pela Ferguson, tradicional produtora de veículos agrícolas. Se usado na neve,   era simplesmente espetacular — e mesmo em asfalto seco era admirável, com ótima estabilidade.

Os freios a disco foram desenvolvidos pela Dunlop, famoso fabricante de pneus britânico, baseado em sistemas aeronáuticos. Traziam sistema antitravamento (ABS) Maxaret nas quatro rodas, outra inovação. Apenas 320 unidades da versão FF, como esta de  1968, foram produzidas. As duas fileiras de saídas de ar nos para-lamas dianteiros  identificavam esse Jensen

A carroceria por sua vez, foi projetada na Itália pelo competente estúdio Vignale, de Turim,  responsável por vários projetos ousados para a Fiat, Ferrari, Matra e outras marcas famosas. A  carroceria era feita no mesmo país a uma cadência de 600 por ano. Era belíssima, um cupê com  frente longa e traseira curta. Tinha quatro faróis redondos, grade com frisos horizontais e dois faróis  auxiliares retangulares. Nos para-lamas dianteiros havia duas fileiras de saídas de ar (no modelo FF, de Formula Ferguson) com frisos horizontais.

O carro era de 2+2 lugares, apesar de anunciado pela publicidade como um luxuoso esportivo de  quatro lugares e alto desempenho. A traseira tinha uma queda suave, marcada pelo vidro envolvente que fazia parte de seu bonito perfil. Era um carro bastante exclusivo, diferente e muito luxuoso. Em 1972, num concurso entre jornalistas de vários países, foi considerado um dos 100 mais belos  carros já fabricados. O motor V8 desenvolvia 330 cavalos, que passaram a 385 cavalos no 7,2-litros da versão SP  

No interior destacava-se o couro abundante nos bancos, forrações, apoios de braço e até na tampa do cinzeiro. A qualidade dos materiais empregados era superior; a sofisticação e o requinte    britânico estavam presentes. Na época citavam seu acabamento como digno de um Rolls-Royce — era um carro praticamente feito à mão. O painel chamava a atenção pela ótima instrumentação,  incluindo conta-giros, indicador de carga da bateria e pressão do óleo, luz de aviso de portas mal  fechadas e outros indicadores.

O volante tinha três raios em metal, boa empunhadura e aro de madeira. A alavanca do cambio  automático era toda cromada. Levando-se em conta ser um esportivo, o porta-malas era bom e o  vidro traseiro fazia parte da tampa, num tempo em que não se usava a denominação hatchback.

O modelo conversível também era muito bonito. A proteção da capota guardada chamava atenção pelo  capricho e luxo do material. Claro que esta capota tinha um sistema elétrico de abertura, eficiente e  sofisticado.

O modelo conversível é o mais valioso no mercado de clássicos, por sua reduzida produção e estilo de muito charme. A versão de 1974 traz as linhas com que os Jensens  deixaram de ser fabricados

A imprensa na época referia-se a ele como “o carro perfeito” e de preço “caro-moderado”. Custava   13.500 dólares em 1970, o dobro de um Jaguar 420 (conheça) ou Ford Thunderbird (saiba mais) e três vezes um Mustang GT/A — mas 2.000 dólares a menos que um Ferrari 330 GTC. Suas vendas nos Estados Unidos   foram boas, já que o motor não era motivo de preocupação para manutenção. 

Em 1969 aparecia o modelo Mark II, com suspensão e freios revistos e novo painel. Três anos  depois o Interceptor FF cedia lugar a uma versão mais potente, denominada SP, apresentada no  Salão de Londres de 1971. O novo coração pulsava com 7,2 litros, três carburadores de corpo duplo e 385 cavalos.  Externamente as alterações eram quase irrelevantes. Mais tarde viria o modelo Mark III () carro das fotos Retroauto) , 10  centímetros maior, com a mesma mecânica e freios ventilados, e o conversível ganharia capota rígida (hardtop), opção com apenas 54 unidades produzidas.  

Interior luxuoso, painel completo e volante de madeira. O Interceptor tinha dois lugares de menor conforto na traseira e o vidro traseiro subia com a tampa do porta-malas 


Cotação

O mais caro Jensen colecionável é o conversível de 1976,  cotado em cerca de 35.000 dólares no mercado europeu. O Interceptor FF produzido de 1967 a 1971 vale entre 15.000 e 30.000 dólares. Foram fabricados apenas 320 exemplares do FF. São raros em anúncios de revistas internacionais de carros antigos: os felizes donos não querem se desfazer dessa joia rara da coroa   britânica. Quando há algum anúncio, sempre é citado o número de série, a documentação e se faz parte de algum clube de  aficionados. 

Para atingir a um público de poder aquisitivo menor, em 1972 a fábrica contou com a ajuda de Donald Healey, famoso pelo bem sucedido Austin-Healey, para a construção de um modelo novo.  Veio então ao mercado um esportivo mais simples: um conversível de linhas convencionais mas  atraentes, e de bom desempenho. 

Com a cooperação de Donald Healy,   autor de um bem-sucedido Austin, nascia um Jensen menor e mais   acessível, mas de bom   desempenho: chegava a 195 km/h   com motor Lotus de 142 cavalos 

Optou-se pelo motor Lotus de quatro cilindros, dois litros e 142 cavalos, com que alcançava 195 km/h e  chegava a 100 km/h em cerca de 10 segundos. A intenção era atingir o mercado norte-americano,  por isso já contava com para-choques maiores e mais salientes. Também tinha belas rodas de  alumínio. 

A alta cúpula da Jensen Motor, porém, não estava se entendendo bem. Havia disputa pela posse da   empresa. A crise do petróleo que se seguiu em 1973 também afetou as vendas de um carro caro e luxuoso como o Interceptor. Por causa destes fatores a fábrica encerrou suas atividades em 1976. 

Admiradores da marca tentam ressuscitá-la com o belo roadster S-V8, com motor Ford de 4,6 litros. Pode ser um novo capítulo na história da Jensen  

Mais de duas décadas depois, investidores britânicos, admiradores da marca, resolveram apostar  no famoso nome Jensen e relançar a marca com o S-V8. Trata-se de um novo conversível, um  autêntico e agressivo roadster. Suas linhas lembram o C-V8. O Ford forneceu o motor V8 de 4,6  litros com 32 válvulas que equipava o Mustang Cobra e sua velocidade máxima está estimada em 260  km/h.

Poderia ser a ressurreição de uma marca que se notabilizou pela sofisticação, esportividade e avanço tecnológico.


Ficha técnica – Interceptor 6.300

  • MOTOR – longitudinal, 8 cilindros em V; comando de válvulas no bloco; 2 válvulas por cilindro.
  • Cilindrada: 6.300 cm³. Taxa de compressão: 8,5:1. Um carburador de corpo quádruplo. Potência     máxima bruta: 330 cavalos.
  • CÂMBIO – manual, 4 marchas, ou automático Torqueflite (modelo FF); tração traseira.
  • FREIOS – a disco nas quatro rodas.
  • RODAS – 15 polegadas ; pneus, 6,70 x 15.
  • DIMENSÕES – comprimento, 4,76 m; largura, 1,75 m; altura, 1,35 m; capacidade do tanque, 72 l;  peso, 1.680 kg.
  • DESEMPENHO – velocidade máxima, 219 km/h; aceleração de 0 a 100 km/h, 7,3 s (Interceptor 6.300); 228 km/h, 6,7 s (FF 6.300); 239 km/h, 6,9 s (SP 7.200).

A intriga internacional

A semelhança — incrível para alguns — do Jensen com nosso Brasinca GT 4200 Uirapuru,   apresentado no início dos anos 60, quase causou problemas. O vidro traseiro era muito parecido,   pois fazia parte da lateral. Havia lá suas semelhanças no resto do conjunto, mas o que chamava  mais a atenção era este detalhe. Já o acabamento e a motorização não tinham nada em comum  com o carro brasileiro. O grande vidro traseiro   envolvente era similar ao do  Brasinca 4200 GT brasileiro, mas o Interceptor usava um  motor Chrysler V8 de 6,3  litros

Brasimca_Uirapuru_4200_GT_Site_Garage_(8)

O bonito e original esportivo nacional foi projetado por Rigoberto Soler. De origem espanhola,  chegou jovem ao Brasil e trabalhou na década de 60 nas extintas Vemag e Willys-Overland do  Brasil. O Uirapuru foi lançado no salão de 1962. Usava mecânica Chevrolet originária dos picapes   GM, com motor de 4,2 litros, seis cilindros em linha e três carburadores. Foram fabricados só 75   exemplares do bonito 4200 GT. (Conheça)


Texto, fotos e montagem Francis Castaings. Fotos de divulgação                                                          

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