Bianco S. Beleza é fundamental

Bianco S. Beleza é fundamental

Ottorino Bianco, conhecido como Toni Bianco nasceu em Concordia Sagittaria, Itália em 8 de janeiro de 1931. É um empresário e projetista automobilístico italiano, radicado no Brasil Este artigo é uma homenagem ao seu aniversário e suas criações.

Em 1976, no Salão do Automóvel em São Paulo, era apresentado mais um esportivo nacional com carroceria em plástico reforçado com fibra de vidro e as consagradas plataforma e mecânica Volkswagen: o Bianco. Era obra de Toni Bianco, famoso projetista paulista de origem italiana, que desde a década de 60 projetava carros de competição — é dele também o projeto do primeiro Fórmula 3 nacional.

Para aqueles que já acompanhavam as corridas no País, porém, a carroceria do Bianco não era novidade. Um carro muito semelhante, com o nome de Fúria, correra nos principais autódromos do Brasil. Usava mecânica do FNM 2150, do Chevrolet Opala, V8 da Chrysler, BMW e até um V12 Ferrari (veja no box abaixo)

O sucesso na exposição foi grande: foram vendidas no estande 180 unidades. O esportivo de linhas modernas agradava por sua beleza de qualquer ângulo que fosse visto. Como manda a regra, tinha dois lugares, linhas curvas e muito aerodinâmicas. Para um carro com estas características, a área envidraçada era ampla, o para-brisa enorme e envolvente, e sua visibilidade para frente e os lados era muito boa. O enorme e envolvente para-brisa e os para-lamas sinuosos eram marcas do estilo do Bianco, criado pelo famoso projetista de carros de competição Toni Bianco

Suas linhas eram originais e lembravam protótipos europeus do Campeonato Mundial de Marcas. Tinha entradas de ar sobre o capô, para aeração interna, e na traseira para o motor. Era baixo e na traseira se destacavam três lanternas redondas, as mesmas da linha Opala da época. Compacto, media 3,8 metros de comprimento. O painel trazia novo desenho e instrumentação completa, com conta-giros, marcadores de pressão e temperatura do óleo e relógio.

Por dentro era notável a instrumentação completa, incluindo conta-giros e relógio, além do volante esportivo com aro de madeira e pomo da alavanca no mesmo material. Como itens de série tinha vidros verdes e para-brisa laminado degradê, bancos revestidos em couro e controle elétrico dos vidros. Detalhe interessante era a antena, um fio incorporado ao para-brisa, o que as grandes marcas só adotariam muito depois. A produção mensal girava em torno dos 20 carros: um modelo exclusivo, que não passava despercebido nas ruas, sendo confundido com carros importados. Seus concorrentes eram o famoso Puma (leia história) e o novo Adamo, ambos usando a mesma plataforma e base mecânica que o Bianco. Por isso o desempenho era similar — e muito tímido para um esportivo. Sua aceleração de 0 a 100 km/h estava na casa dos 15 segundos e a velocidade máxima era de 150 km/h.

As lanternas traseiras eram as do Opala da época. O interior trazia revestimento em couro, controle elétrico dos vidros e volante com aro de madeira

Os sedãs de seis e oito cilindros existentes na época exibiam números bem mais apreciáveis. Caso recebesse preparação no motor, já muito desenvolvida para a mecânica VW, o desempenho melhorava bastante. Tinha freios a disco na dianteira, rodas bastante largas (8 polegadas de tala) e pneus 185/70 R 13, que ajudavam na estabilidade apesar da precária suspensão. O comportamento geral era muito bom, com ajuda da ótima aerodinâmica. Se a mecânica não era dos maiores atrativos, o desenho e a sofisticação interna atendiam aos mais exigentes. Ganhava de seus concorrentes em dirigibilidade, visualização e instrumentação do painel, acabamento e nível de ruído.

Nos testes, a velocidade final foi boa para os padrões brasileiros da época: chegou a alcançar 170 km/h. Havia planos de produzir até 10 unidades por mês. Não há dados de quantos foram produzidos exatamente. Em 1978 chegava a Série 2. As poucas alterações externas eram logo vistas no capô, que não tinha mais as entradas de ar. Atrás, na parte inferior da carroceria, abaixo da placa, havia saídas em forma de triângulo que ficavam entre os dois canos de escapamento. Antes das caixas de roda traseiras surgiam pequenas entradas de ar horizontais para o motor. Por dentro o Bianco ganhava novos bancos em couro e forração das portas no mesmo material. O espaço atrás dos encostos também estava maior — para pequenas bagagens. Um problema enorme dos carros de fibra na época era a vedação: em chuvas fortes entrava água mesmo. Mas o fabricante melhorou esta versão com um trabalho mais cuidadoso e materiais mais nobres.

No quesito segurança, vinham cintos de segurança de três pontos, novas palhetas dos limpadores dos para-brisa e uma luz espia que indicava pane nos sistemas de freios. Fez sucesso também no Salão do Automóvel de Nova York, em 1978.


O Tarpan

Ainda em 1978 era apresentado o Tarpan. Em princípio este carro seria uma evolução do Bianco, mas suas linhas estavam longe de agradar a todos. No salão foi apresentado com mecânica do Passat TS, de 1,6 litro e ótimo desempenho para a época. Foi prometido com quatro freios a disco, para-choques retráteis, um isolamento térmico e acústico feito de poliuretano injetado, etc. Mas na produção em série foi utilizada a mesma mecânica do VW Brasília e, por isso, o desempenho continuou modesto.

O estilo agressivo e original foi sempre um destaque do Bianco, mas o desempenho não acompanhava: como inúmeros outros fora de série, utilizava a plataforma e a mecânica VW 1600 “a ar”. Se o Bianco era muito bonito, o mesmo não poderia se dizer do Tarpan: seu desenho já estava ultrapassado. Atrás vinham as mesmas lanternas do irmão, mas na frente os faróis redondos estavam numa posição típica de esportivos da década de 60. A traseira não combinava com o restante do carro, era esquisita e chegava a ser bizarra.

Apesar de esforços na vedação, por dentro o motor mostrava sua presença, fazendo muito barulho. A carroceria de fibra era montada em sistema de painéis duplos. Bem maior que o Bianco, media 4,35 metros de comprimento e usava largos pneus 205/70 SR 13.

Em julho de 1981 a fabrica de Diadema, no ABCD paulista, apresentava o Tarpan TS, enfim com o motor de 1,6 litro e 88 cavalos (líquidos), refrigerado a água, do VW Passat de mesma versão. Na época eram também produzidos o Bianco S, o Tarpan com motor “a ar” e o conversível. Mais nervoso, o TS oferecia desempenho bem adequado, além de ótima estabilidade.

Alguns defeitos persistiam, como a posição de dirigir que não era das mais agradáveis. Não era barato: custava quase o mesmo que um Opala Diplomata de seis cilindros. E como esportivo, era concorrente do Farus, que trazia a mesma mecânica do TS e desenho de carroceria e soluções mecânicas bem mais modernas. Não foram fabricados muitos modelos do Tarpan.

Na década de 70 e 80, pelo fato de a importação de carros ser proibida no país, o número de fabricantes de veículos especiais era muito grande e a concorrência forte. A fábrica do Bianco e do Tarpan, que não era filiada à Anfavea assim como outros pequenos fabricantes, enfrentou problemas financeiros e fechou suas portas em meados da década de 80, deixando para trás uma história de maior sucesso nas pistas que nas ruas.


Nas Pistas

Toni Bianco foi o criador do não menos famoso Bino, que usava motor Renault de 1,4 litro na década de 60. Este protótipo foi pilotado por grandes nomes do nosso automobilismo e venceu várias provas de relevância. Realmente revolucionário e um dos mais famosos carros de corrida nacional. Encomendado pela Fúria Auto Esporte, equipe paulistana de corridas da década de 70, o Fúria acenava com a possibilidade da colocação de vários motores.

Em 1970 fez sua estreia nos principais autódromos e circuitos do país. Participou do auge do automobilismo brasileiro, que começava a se profissionalizar. Correu no circuito de rua de Brasília, que utilizava sua enormes e largas retas, também em Curitiba e em Interlagos, na 12 Horas e na 500 Quilômetros de Interlagos.

Dos vários motores do Fúria, o BMW era evidenciado pela grade em “duplo rim”. Com ele, Jaime Silva chegou em segundo lugar em duas baterias da 6 Horas de Interlagos, em 1971

Neste último, o motor usado foi de um Lamborghini Miura, com 12 cilindros em “V”, quatro comandos de válvulas e quatro carburadores triplos Weber. Potência para ninguém botar defeito — mas defeito é o que deu nesta prova. A primeira vitória do Fúria veio no Grande Prêmio Mackenzie, no autódromo da capital paulista. Obteve a melhor volta, cravando 3 minutos e 21 segundos à média de 144,28 km/h. A famosa carretera de Camilo Cristófaro, com motor Corvette, e o próprio Bino também correram e foram vencidos.

Na Mil Milhas de Interlagos, em janeiro de 1971, o Fúria Alfa Romeo chegou em quinto lugar nas mãos de Jaime Silva e Ugo Galina. O protótipo de cor vermelha terminou cinco voltas atrás do vencedor. Correu contra Porsche 910 e Ferrari 512 S, entre outros. Nesta prova o Bino também participou.

No inicio de 1971, com motor Chevrolet quatro-cilindros de 2,5 litros e várias peças importadas como carburadores e coletores, atingia a potência de 170 cv. O novo Fúria, na cor azul, com número 84, nas mãos do famoso Pedro Victor De Lamare, quase bateu o recorde da pista de Interlagos na prova de 12 horas. Chegou a ficar em terceiro lugar. Também nesta participou o Fúria Alfa Romeo, cuja maior diferença externa era não ter a traseira aberta como a do Fúria Chevrolet.

Nas mãos do famoso Pedro Victor De Lamare, o Fúria com motor 2,5 da Chevrolet quase bateu o recorde da pista de Interlagos na prova de 12 horas, também em 1971. Com mecânica do FNM 2150, o Fúria Alfa atingia 138 cavalos a 7.000 rpm. Contava com dois carburadores Weber duplos, câmbio e diferencial Hewland – famosos em todos os carros de corrida na Europa – chassi tubular e freio a disco nas quatro rodas. Com peso por volta dos 650 quilos, nesta configuração a velocidade máxima anunciada era de 240 km/h.

Na Seis Horas de Interlagos, disputa em três baterias de duas horas cada, o Fúria BMW pilotado por Jaime Silva chegou em segundo lugar nas duas primeiras e se acidentou na última. O carro era azul, com numero 9 e a grade dianteira com o “duplo rim” denunciava a motorização alemã.

Na prova 300 Quilômetros de Tarumã foi cotado como um dos poucos opositores aos dois Porsche da Equipe Hollywood, um 910 e outro 908. Largou em terceiro atrás destes dois bem mais potentes e preparados. Mas os mecânicos tiveram muitos problemas com o motor BMW que chegou inclusive a fundir.

Em 2010 na cidade de Araxá, Minas Gerais, no evento Brazil Classics Fiat Show, XIX Encontro Nacional de Automóveis Antigos foi prestada uma homenagem a Toni Bianco e estavam lá os bólidos de corrida Fúria com motorização BMW, outro vermelho com motor Alfa-Romeo e na ala de Alfas antigos um raro exemplar do belo Fúria GT ano 1972.


Ficha técnica

Motor traseiro Volkswagen com quatro cilindros horizontais opostos, refrigerado a ar com comando central. Diâmetro e curso: 85,5 x 69 mm. Cilindrada: 1.584 cm³. Taxa de compressão: 7,2:1. Dois carburadores de corpo simples. Potência máxima bruta: 65 cavalos a 4.600 rpm. Torque máximo bruto: 11,7 m.kgf a 3.200 rpm.

Câmbio manual, quatro marchas; tração traseira, freios dianteiros a disco, traseiros a tambor, rodas  8 x 13 polegadas com pneus, 185/70 R 13 S. Dimensões: Comprimento, 3,8 m; largura, 1,66 m; altura, 1,16 m; entre-eixos, 2,4 m; peso, 825 quilos.  Desempenho: Velocidade máxima de 150 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h, 15 segundos


Raro Exemplar

Com grande experiência em carros de corridas e protótipos, Toni Bianco trabalhava junto de Vitório Massari e Azevedo Santos na empresa Fúria Auto Esporte Ltda. Estavam muito empolgados na época e fizeram um projeto em 1971, a pedido da FNM: o carro-esporte Fúria. O GT de 2+2 lugares foi baseado no Lamborghini Jarama — era quase idêntico. Usava a mecânica do sedã de quatro portas FNM 2150. O motor com quatro cilindros com duplo comando de válvulas no cabeçote, que seria também usado no Alfa Romeo 2300 anos mais tarde, recebeu dois carburadores duplos e maior taxa de compressão.


Texto, Fotos e montagem Francis Castaings.

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