José Carlos Pace: O quarto campeão. Nascido em 1944. Há 80 anos.
Um Piloto Chamado José: O Quarto Campeão
No Brasil temos nomes muito comuns em todo território nacional. Onde não tem um José ou um Silva? Aqui também temos ícones do esporte que poucos países têm. E quem diria há 50 anos atrás que o Brasil revelaria tantos nomes com talento inquestionável no automobilismo. A primeira surpresa vinda da América latina foi o grande Juan Manoel Fangio, mas um brasileiro de origem italiana já havia estado em continente europeu avisando que nosso país tinha várias promessas por vim. Era Francisco Sacco Landi, mais conhecido como Chico Landi. Na década de 60 nosso automobilismo começou a tomar impulso principalmente nos circuitos de rua do Rio de Janeiro, na pista de Interlagos e nas estradas do Rio Grande do Sul. No eixo Rio São Paulo grandes nomes seriam lançados. Era a época do começo de nossa indústria automobilística e dos apreciadores da velocidade tirarem proveito.
Nomes começaram a aparecer nas poucas revistas especializadas da época e na parte de esporte dos jornais. Alguns iriam fazer uma bela carreira internacional, outros não teriam a mesma sorte. Os irmãos Fittipaldi, Wilsinho e Emerson eram presenças constantes nas pistas, mas também viria outro que seria muito importante. Era José Carlos Pace.
Nascido em seis de outubro de 1944, era apenas dois anos mais velho que Emerson e paulistano como ele. Era o filho caçula de Ângelo e Amélia Pace. Ainda criança ganhou dos pais um carrinho de corrida, um charutinho que o menino gordinho simplesmente adorava. Com cinco anos de idade foi com os pais para a Itália e passou seis meses por lá entre várias pequenas cidades. Fez amiguinhos e por lá adorava apavorar os habitantes pacatos correndo muito em bicicletas e ficou encantado ao ganhar uma miniatura de uma Ferrari.
Retornado ao Brasil os pais já se acostumavam com um menino de boa índole, porém muito travesso. Com apenas nove anos de idade dirigiu um caminhão carregado de tijolos. Felizmente não houve acidente e apenas as orelhas de “Carlinhos” ficaram um pouco maiores. Mais tarde, vizinhos de um senhor alemão, que era um ótimo marceneiro, ganhou um carrinho de rolimã e as corridas nas ladeiras do bairro de Pacaembu tornaram-se frequentes. Já na adolescência ganhou um apelido que o acompanharia pelo resto de sua vida: Moco. Alguns diziam que era pelo fato de ter mãos pequenas suficientes para segurar um volante. Nesta época conheceu os irmãos Fittipaldi e outros que amavam os veículos de quatro rodas.
Como a maioria dos iniciantes começou no Kart, na equipe Mini, aos 17 anos e lá se mostrou arrojado, principalmente por fazer a alegria da pequena torcida com suas saídas de traseira tornando a corrida mais emocionante. Também dirigia o Simca Chambord do pai e foi com ele que conheceu Elda, uma bela jovem de 14 anos que aos poucos foi chamando o rapaz de Zé. Começaram a namorar e todo o equipamento dele usado na pilotagem ficava na casa da namorada Elda, pois Seu Ângelo e Dª Amélia nem sonhavam que o filho caçula era um frequentador do asfalto de Interlagos.
Não se deu bem no Kart por causa do peso e logo ingressou nas categorias de turismo que eram as de maior sucesso no Brasil. E foi, depois de algumas trapalhadas por causa de pouco treino, num DKW (Saiba mais sobre a linha DKW Brasil) preto bem preparado que José Carlos Pace chegou em segundo lugar nas 100 Milhas de Piracicaba. Estava ansioso por estrear em Interlagos e aconteceu numa prova tumultuada em agosto de 1963. Tumultuada, pois alguns carros não estavam dentro do regulamento e na classe até 850 cm³ Carol Figueiredo ficou em primeiro e Moco em segundo. Ambos com carros Dauphine da equipe Willys. Abaixo Pace no lado esquerdo de uma Berlineta Interlagos com o capacete sobre o para-lamas.
A carreira estava começando e a corrida em Araraquara, interior de São Paulo, seria muito importante na carreira do piloto. Foi sua primeira vitória na classe pilotando um Willys Interlagos.
O carro era dele, mas o motor foi emprestado por Luiz Antônio Greco, chefe da equipe oficial de fábrica.
Em 1964 já era integrante da equipe de carros amarelos com uma pequena faixa verde na parte superior. As Berlinetas Interlagos, mais rápidas e sofisticadas eram entregues aos pilotos mais experientes e os Gordini ficavam com os “aprendizes”. Moco não se intimidou e ganhou na classe até 850 cm³ As Três Horas de Interlagos. Na prova seguinte, com as fábricas participando com muito empenho, a Simca inscreveu o modelo Abarth para fazer frente ao Interlagos. Já com as mãos no volante da Berlineta, numa disputa feroz, Moco chegou em terceiro nos 500 Quilômetros de Interlagos atrás de Luis Pereira Bueno, bem mais experiente que era seu companheiro de equipe e Ciro Cayres vencedor com o Abarth. Ainda este ano, nas Seis Horas de Curitiba, os Gordinis ganharam nas mãos de Bird Clemente, Wilson Fittipaldi, Pace e Carol Figueiredo. No Rio de Janeiro, nos 500 Quilômetros da Guanabara Moco tornou a chegar em segundo junto com Vittorio Andreatta numa Berlineta Interlagos.
O ano de 1965 não seria bom para José Carlos Pace por conta de várias indefinições nas equipes brasileiras, mas 1966 seria um ano de grandes glórias e mudanças. A famosa equipe Dacon se formava graças a Paulo Goulart, muito amigo seu e outros de seu círculo. Na época Moco já era um feliz proprietário de um Porsche 911. Nosso piloto era simpático, simples e modesto e nem todos sabiam que seu pai era dono de uma famosa tecelagem.
A primeira vitória da equipe paulista com Moco pilotando um Karmann-Ghia aconteceu numa corrida disputada em três baterias no Autódromo de Interlagos. Moco venceu as duas ultimas disputando muito com o Malzoni GT (saiba mais) com propulsor DKW de Chico Lameirão. Não ganhou a primeira, pois a porta de seu Karmann-Ghia estava abrindo a cada curva logicamente atrapalhando muito a pilotagem. Também tirou o segundo lugar na inauguração do Autódromo Internacional do Rio de Janeiro.
No final do ano, nos 1000 Quilômetros da Guanabara o Show foi mais completo. A dupla Wilson Fittipaldi e Ludovico Perez tiraram o primeiro lugar e Moco e Totó Porto em segundo. A cada prova Moco se mostrava mais agressivo e mais seguro de sua pilotagem. Em maio de 1967, nos 1.000 Quilômetros de Brasília, a equipe Dacon levou os três primeiros lugares. Moco e Wilsinho venceram de ponta a ponta honrando a última prova da equipe paulistana.
Um ano depois estaria de volta à equipe Willys dirigindo o belo protótipo Bino Mk II com motor Renault de 1300 cilindradas, 110 cavalos de potência e peso de 570 quilos. . Era mais uma prova que os brasileiros sabiam fazer um bom carro de corridas. Junto com Luis Pereira Bueno, venceu os 1000 Quilômetros de Brasília e outras duas provas no Rio de Janeiro. Tornaram-se campeões brasileiros e Moco tinha muito orgulho disso. Estreava a Fórmula Vê e venceria a primeira etapa do Campeonato Brasileiro. Provava que também era bom em monopostos.
O ano de 1969 seria de novos carros, vários importados e muito potentes e novas equipes no Brasil. Nas três Horas do Rio de Janeiro Moco ganhava a prova com um dos mais belos e potentes protótipos da década de 60. Era um Alfa Romeo P-33. Estava com um carro muito superior aos seus concorrentes, mas não lhe tirava o mérito.
Ainda este ano venceria com o mesmo carro nos 500 Quilômetros de Salvador com Marivaldo Fernandes e em dupla com este também venceu o Mil Quilômetros de Brasília com um Alfa Romeo GTA. Este respeitável e competente piloto brasileiro se tornaria um grande amigo seu. Outros expoentes que o apoiavam muito eram os irmãos Alcides e Abílio Diniz.
Em 1970 partia para a Inglaterra como fizera os irmãos Fittipaldi. Na época era o melhor país para os brasileiros aprenderem mais e também para aparecerem para os construtores e empresários europeus. Fazendo parte da equipe de Fórmula Três do renomado Jin Russel, Moco ganhou quatro corridas, tirou cinco segundo lugares e também cinco terceiros tornando-se campeão do Forward Trust e terceiro no importante Lombank Trophy. Já era casado com a antiga e bela namorada Elda Regina D’Andrea e moravam em Attleborough não muito longe da pista de Snetterton
Em 1971 disputaria a Fórmula Dois e Três na Europa e no Brasil. Aqui teve adversários famosos como David Walker, Wilson Fittipaldi Junior, David Purley, Fritz Jordan, Marivaldo Fernandes, Alan Jones e Luis Pereira Bueno. Moco estava numa Lotus 59 amarela da Equipe Bino.
Na categoria que antecede a Fórmula Um estava com um March 712 (acima) da Equipe Frank Williams, mas não obteve resultados expressivos.
Foi assim também em 1972 a exceção de um segundo lugar na terra de Fangio nas 200 Milhas de Balcarce. Neste mesmo ano estrearia na Fórmula Um na África do Sul com um March 711 preto da equipe de Frank Williams com motor Cosworth V8. Chegou em sexto na Espanha, segunda corrida e em quinto na Bélgica, no circuito de Nivelles onde Emerson Fittipaldi ganharia com um Lotus. Uma valorosa estreia seria no Campeonato Mundial de Marcas pilotando um Ferrari 312P.
Foi o segundo colocado nos 1000 Quilômetros de Zeltweg na Áustria e pilotando um Gulf-Mirage chegou em terceiro nas Seis Horas de Watkins Glen nos Estados Unidos. Nestes carros velozes também mostrou competência na CAN-AN com um Shadow. Na Fórmula Um com um Surtees TS-9 chegou em segundo em Brands Hatch numa prova que não contaria para o campeonato.
Em 1973 pilotava um Surtees TS-14, ainda muito fraco em relação aos outros carros e chegou em quarto na Alemanha e em terceiro na Áustria. No Mundial de Marcas brilharia na Alemanha nos 1000 Quilômetros de Nürburgring e nas 24 Horas de Le Mans com o Ferrari 312 P em dupla com o italiano Arturo Merzario chegando em ambas as provas em segundo lugar. Comentava-se na época que Enzo Ferrari estaria com vontade de tê-lo no time da Fórmula Um. Nesta época inclusive a equipe dos fórmulas vermelhos não estava muito bem e por isso não teria animado Pace.
Em 1974 ainda na Surtees tira um quarto lugar no Brasil, mas felizmente trocava de equipe. Foi para a Brabham conseguindo um quinto lugar em Monza na Itália e um belo segundo nos Estados Unidos com o modelo BT44. Seu companheiro de equipe era o argentino Carlos Reutemann. Outro bom convite surgia. A Matra, bicampeã Mundial de Marcas queria ele pilotando um MS 670, mas Moco queria se dedicar mais a Fórmula Um e vir mais ao Brasil.
Em 1975 a consagração e o reconhecimento vieram num domingo muito especial. O Grande Prêmio do Brasil nosso público viu um pódio verde amarelo com José Carlos Pace em primeiro e Emerson em segundo. Foi aclamado pelo público, deu um beijo especial em Elda e depois em sua mãe. Nos boxes, após a comemoração, excessivamente cansado, agradeceu muito ao pessoal da equipe e aos patrocinadores, principalmente os brasileiros. Num ano muito bom Moco ainda chegou em terceiro em Monte Carlo e segundo em Silverstone na Inglaterra. Ficou em sexto no campeonato atrás de Niki Lauda, o campeão, Emerson, seu companheiro Carlos Reutemann, James Hunt e Clay Regazzoni.
Sempre que podia vinha ao Brasil para disputar o Torneio Brasileiro de Turismo Nacional com um Ford Maverick Quadrijet (acima) fazendo dupla com Paulo Gomes. Venceram as 12 Horas de Goiânia, os 500 Quilômetros de Brasília e as 12 Horas de Tarumã no Rio Grande do Sul conquistando o título de Campeão Brasileiro novamente.
Para promover o novo Ford Maverick com motor 2,3 OHC houve o Campeonato Torneio Sul Americano com duas provas e duas baterias. Uma em Brasília e outra em Interlagos. Moco simplesmente deu um show com seu carro azul número 10. Este pequeno desafio contou com o mineiro Alex Dias Ribeiro, a simpática presença do italiano Vittorio Brambilla e dos argentinos Luiz Ralph Di Palma e Jorge Recalde que comeram muita poeira. Os carros foram sorteados e eram idênticos. Valeu o braço do nosso Moco. Para fechar o ano com chave de ouro no Turismo venceu as 25 Horas de Interlagos ao lado de nomes muito prestigiados do automobilismo nacional: Paulo Gomes e Bob Sharp.
Na época a Brabham inseria o motor Alfa Romeo com doze cilindros em “V”. Era potente, mas estava em fase de desenvolvimento e não houve bons resultados para o belo carro vermelho nesta temporada. Foram apenas um sexto na Espanha, um quarto em terras francesas e outro na Alemanha.
Em 1977 começou bem na Argentina, mas passou mal, teve uma desidratação e chegou em segundo lugar. Nessa época poucos pilotos se preocupavam com a preparação física.
Infelizmente para Elda, Patrícia com quatro anos e Rodrigo com um, e todos que o amavam muito no Brasil e no mundo das corridas, José Carlos Pace, o Moco, perderia a vida em 18 de março deste ano num estúpido acidente aéreo. Junto dele estavam o piloto do avião e também Marivaldo Fernandes.
O Brasil não só perdia um homem de caráter e muito profissional. Mas ia para o céu o quarto campeão mundial de Fórmula Um brasileiro antes de Piquet e Senna, pois não lhe faltavam qualidades técnicas para tal. Em 1986, o mais famoso autódromo e templo do automobilismo nacional, Interlagos, passava-se se chamar José Carlos Pace em homenagem a esse grande piloto que quem viu correr jamais esquece de seu estilo único.
Nas telas
Em 1976 Moco vai para as telas do mundo ajudar Al Pacino. Foi ele quem fez as cenas perigosas no filme Bobby Deerfield (Um Momento, Uma Vida é um filme do gênero drama e romance que estreou em 1977, realizado por Sydney Pollack (famoso produtor e diretor de cinema). Deerfield é um piloto americano que vai correr na Europa. Nas cenas de pista Pacino veste o capacete preto com a seta amarela e o macacão de Pace. Veja um trecho
Em Escala – O Interlagos em miniatura na escala 1/43 fabricada pelo IXO
A miniatura do Brabham BT 44B Grande Prêmio do Brasil em 1975 quando ganhou.
Um dos carros do piloto exposto no Forte de Copacabana, Rio de Janeiro.
Comercial para a TV
Fez um comercial para a TV usando um Ford Maverick. Clique e veja.
O Livro de Luiz Carlos Lima que em breve terá uma reedição
Texto, fotos e montagem Francis Castaings. Fotos Maverick nº22 são do acervo de Bob Sharp. Demais fotos de divulgação
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